1. Muita gente que ouve a expressão ―políticas
2. linguísticas‖ pela primeira vez pensa em algo
3. solene, formal, oficial, em leis e portarias, em
4. autoridades oficiais, e pode ficar se
5. perguntando o que seriam leis sobre línguas.
6. De fato, há leis sobre línguas, mas as políticas
7. linguísticas também podem ser menos formais
8. – e nem passar por leis propriamente ditas.
9. Em quase todos os casos, figuram no
10. cotidiano, pois envolvem não só a gestão da
11. linguagem, mas também as práticas de
12. linguagem, e as crenças e valores que
13. circulam a respeito delas. Tome, por exemplo,
14. a situação do cidadão das classes confortáveis
15. brasileiras, que quer que a escola ensine a
16. norma culta da língua portuguesa. Ele folga
17. em saber que se vai exigir isso dos candidatos
18. às vagas para o ensino superior, mas nem
19. sempre observa ou exige o mesmo padrão
20. culto, por exemplo, na ata de condomínio,
21. que ele aprova como está, desapegada da
22. ortografia e das regras de concordância
23. verbais e nominais preconizadas pela
24. gramática normativa. Ele acha ótimo que a
25. escola dos filhos faça baterias de exercícios
26. para fixar as normas ortográficas, mas pouco
27. se incomoda com os problemas de redação
28. nos enunciados das tarefas dirigidas às
29. crianças ou nos textos de comunicação da
30. escola dirigidos à comunidade escolar. Essas
31. são políticas linguísticas. Afinal, onde há
32. gente, há grupos de pessoas que falam
33. línguas. Em cada um desses grupos, há
34. decisões, tácitas ou explícitas, sobre como
35. proceder, sobre o que é aceitável ou não, e
36. por aí afora. Vamos chamar essas escolhas –
37. assim como as discussões que levam até elas
38. e as ações que delas resultam – de políticas.
39. Esses grupos, pequenos ou grandes, de
40. pessoas tratam com outros grupos, que por
41. sua vez usam línguas e têm as suas políticas
42. internas. Vivendo imersos em linguagem e
43. tendo constantemente que lidar com outros
44. indivíduos e outros grupos mediante o uso da
45. linguagem, não surpreende que os recursos
46. de linguagem lá pelas tantas se tornem, eles
47. próprios, tema de política e objetos de
48. políticas explícitas. Como esses recursos
49. podem ou devem se apresentar? Que funções
50. eles podem ou devem ter? Quem pode ou
51. deve ter acesso a eles? Muito do que
52. fazemos, portanto, diz respeito às políticas
53. linguísticas.
Adaptado de: GARCEZ, P. M.; SCHULZ, L.
Do que tratam as políticas linguísticas.
ReVEL, v. 14, n. 26, 2016.